Jean-Luc Nancy sobre o papel da arte
A arte abre outras possibilidades de mundo
Jean-Luc Nancy sobre o papel da arte
Nessas condições o que a arte abre? abre outras possibilidades de mundo. Eu diria que a arte está aí, cada vez, para abrir o mundo, para abrir o mundo a si mesmo, a sua possibilidade de mundo, de abrir outros sentidos, entanto o sentido já dado está fechado.
Por esta razão se diz que cada artista tem um mundo, ou quase poderia se dizer que cada artista é um mundo: Michelangelo, Picasso, Cézanne, Brancusi, e isso poderia ser afimado de todos os outros, como Beethoven, Verdi ou Proust. Cada um deles é um mundo, uma possibilidade de significações de alguma maneira fechada em si mesma, mas, ao mesmo tempo, abrindo o possível, abrindo o possível a partir da apertura do espirito, da sensibilidade das pessoas, abrindo a nossa sensibilidade, abrindo-a a uma nova possibilidade de formas que ela ignorava até então.
Jean-Luc Nancy, Arte hoje. (2007). [Traduzido ao português a partir da edição em espanhol. Trad. M. Domecq.]
JOHN DEWEY: ARTE COMO EXPERIÊNCIA
[As experiências estéticas da vida cotidiana (singulares, cativantes, contrastantes, emocionantes, articuladas...) como base para compreender as experiências estéticas na arte e como fonte ou origem das obras de arte.]
O mecânico inteligente, empenhado em sua atividade e interessado em bem executá-la, encontrando satisfação em seu trabalho e cuidando com genuína afeição de seu material e suas ferramentas, está artisticamente engajado.(...)
(...) Até uma experiência tosca, se for genuína, está mais apta para dar uma pista da natureza intrínseca da experiência estética do que um objeto já separado de qualquer outra modalidade de experiência [se refere a obra de arte consagrada pela crítica e exposta num museu].
(...) Para mim, porém o problema das teorias existentes é que elas partem de uma "compartimentalização" pronta ou de uma concepção da arte que a "espiritualiza", retirando-a da ligação com os objetos da experiência concreta. A alternativa a essa espiritualização, entretanto, não é a materialização degradante e prosaica das obras de arte, mas uma concepção que revele de que maneira essas obras idealizam qualidades encontradas na experiência comum.
DEWEY, John. Arte como Experiência. Trad. Vera Ribeiro, SP: Martins Fontes, 2010. pp 62-72
Talvez possamos ter uma ilustração geral, se imaginarmos que uma pedra que rola morro abaixo tem uma experiência. Com certeza, trata-se de uma atividade suficientemente "prática". A pedra parte de algum lugar e se move, com a consistência permitida pelas circunstâncias, para um lugar e um estado em que ficará em repouso - em direção a um fim. Acrescentemos a esses dados externos, à guisa de imaginação, a ideia de que a pedra anseia pelo resultado final; de que se interessa pelas coisas que encontra no caminho, pelas condições que aceleram e retardam seu avanço, com respeito a influência delas no final; de que age e se sente em relação a elas conforme a função de obstáculos ou auxílio que lhes atribui; e de que a chegada final ao repouso se relaciona com tudo o que veio antes, como a culminação de um movimento contínuo. Nesse caso, a pedra teria uma experiência, e uma experiência com qualidade estética.
Se passarmos desse caso imaginário para nossa própria experiência, veremos que grande parte dela é mais próxima do que acontece com a pedra real do que qualquer coisa que cumpra as condições que a fantasia acabou de ditar. Isso porque, em muito de nossa experiência, não nos interessamos pela ligação de um incidente com o que veio antes e o que vem depois. Não há um interesse que controle a rejeição ou a seleção atenta do que será organizado na experiência em evolução. As coisas acontecem, mas não são definitivamente incluídas nem decisivamente excluídas; vagamos com a correnteza. Cedemos de acordo com a pressão externa ou fugimos e contemporizamos. Há começos e cessações, mas não inícios e conclusões autênticos. Uma coisa substitui outra, mas não a absorve nem a leva adiante. Há experiência, porém ela e tão frouxa e discursiva que não é uma experiência singular. É desnecessário dizer que tais experiências são inestéticas.
Portanto, o inestético situa-se entre dois limites. Em um polo, está a sucessão solta, que não começa em nenhum lugar particular e que termina - no sentido de cessar - em um lugar inespecífico. No polo oposto, estão a suspensão e a constrição, que avançam desde as partes que têm apenas uma ligação mecânica entre si. Existe um número tão grande desses tipos de experiências que, inconscientemente, elas passam a ser tidas como a norma de toda experiência.(...) Os inimigos do estético não são o prático nem o intelectual. São a monotonia, a desatenção para com as pendências, a submissão às convenções na prática e no procedimento intelectual. Abstinência rigorosa, submissão coagida e estreiteza, por um lado, desperdício, incoerência e complacência displicente, por outro, são desvios em direções opostas da unidade da experiência. (...)
Coisas físicas, vindas dos confins da Terra, são fisicamente transportadas e fisicamente levadas a agir e reagir umas sobre as outras, na construção de um novo objeto. O milagre da mente é que algo parecido ocorre em uma experiência sem transporte nem montagem físicos. A emoção é a força motriz consolidante. Seleciona o que é congruente e pinta com suas cores o que é escolhido, com isso conferindo uma unidade qualitativa a materiais externamente dispares e dessemelhantes. Com isso, proporciona unidade nas e entre as partes variadas de uma experiência. Quando a unidade é do tipo já descrito, a experiência tem um caráter estético, mesmo que não seja, predominantemente, uma experiência estética.
DEWEY, John. Arte como Experiência. Trad. Vera Ribeiro, SP: Martins Fontes, 2010. pp 115-120
[Arte como experiência é uma obra de 1931.]
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Sobre Artes e Artistas (Introdução da História da Arte de E. Gombrich): acesse o texto!
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